GMI - Gémeo Malvado Investiga
Bem, um japonês morreu em Bucareste, devido a um ferimento numa das pernas, depois de se ter arrastado trinta metros, e, consta, fê-lo apenas a tempo de balbuciar “cão” e “ambulância”. O que eu aprendi, das vezes que vi o CSI, mas sobretudo, das inúmeras vezes que vi o “Crime, disse ela”, foi que se deve começar uma investigação questionando insistentemente – feito parvinho mesmo – o óbvio. Vamos partir do princípio que o Honda falou em inglês e que é a coisa mais normal do mundo, numa capital europeia, um oriental arrastar-se durante uns bons metros até se esvair em sangue. Posto isto, e atentado nos parcos dados disponíveis:
- Se o japonês tivesse balbuciado “Drácula” e “Nadia Comaneci”, as conclusões seriam que um japonês foi fatalmente mordido pelo “Drácula” numa das pernas e pediu para lhe chamarem a “Nadia Comaneci”? Ou vice-versa? Onde é que estava a Nadia Comaneci quando este japonês foi mordido por um suposto cão? E será apenas uma coincidência que Bucareste, local do homicídio, fique a apenas 175 quilómetros de Sighisoara, a cidade natal do Conde Drácula?
- Não podia muito bem ser um japonês dread e estar a tentar dizer “Call an ambulance, dog!”? Eles, os dreads, tratam as pessoas por “dog”, que eu já vi em filmes e telediscos de “booty shaking”. Nesse caso, a hipótese “foi um cão que lhe mordeu na perna” ficaria completamente arredada.
- Porque é que não foi uma ambulância que atropelou o japonês que andava a passear o cão? Ou um cão a guiar uma ambulância que o atropelou? Ou uma ambulância que ia para o veterinário com um cão aleijado ou doente na maca? Porque é que não foi ele, o nipónico, que caiu de uma ambulância, quando esta se desviou abruptamente de um cão? Sendo apenas duas palavras, há uma variedade de hipóteses credíveis que, quer-me parecer, nem chegaram a ser consideradas.
- E como é que sabem que o cão era vadio? Se ele só disse “cão”, como é que sabem que o animal não tinha coleira? Até podia ser a Lassie. A Lassie era um cão vadio? Por falar nisso, onde é que estava à Lassie à hora da ocorrência?
- E a máquina fotográfica do japonês? À velocidade que essa gente tira fotos, de certeza que, revelando-se o rolo, dá para ver o que se passou quase como se fosse um filme experimental. Daqueles europeus que ganham prémios e tudo.
Veredicto GMI: é, de facto, um caso sinuoso. Porém, e não havendo resposta para as pertinentes interrogações acima dispostas, essas, as interrogações, tiveram o condão de encarrilar na minha mente uma resolução inequívoca. Logo para começar, afaste-se a hipótese “cão”. Tratou-se, declaradamente, de um homicídio perpetuado por um homem, e não um cão. Só um homem poderia conhecer a anatomia humana de modo a atingir o sinistrado numa zona crítica. Aliás, nesse sentido, terá sido quase de certeza um médico. Sendo um médico, será alguém que seja também invisual ou ávido praticante de caça – porque, invisuais e caçadores, são indivíduos mais associados à imagem do canídeo, o que, em absoluta medida, justifica o facto do perecido ter balbuciado “cão”. Sendo que se tratou de um crime numa zona urbana, vamos partir do princípio que foi um invisual, e não um caçador. Ora bem, tratando-se de um médico invisual, a ambulância também está explicada: é o meio de transporte dos médicos. Consumada a agressão, o médico invisual ter-se-á colocado em fuga na ambulância, não sem antes, e porque não vê a ponta dum corno, ter atropelado e arrastado o japonês durante, claro, trinta metros. Resta apurar o motivo. Todavia, perante argumentos tão sólidos, o apuro da motivação é claramente secundário.